domingo, 20 de novembro de 2011

"Dona Abastança" - Poema de Manuel da Fonseca


Balthus (Polish-French modern artist, 1908 – 2001), The Golden Fruit, 1956
160.5 x 159 cm, Private Collection, Paris, France

 

Dona Abastança


«A caridade é amor» 
Proclama dona Abastança 
Esposa do comendador 
Senhor da alta finança.

Família necessitada 
A boa senhora acode 
Pouco a uns a outros nada 
«Dar a todos não se pode.»

Já se deixa ver 
Que não pode ser 
Quem 
O que tem 
Dá a pedir vem.

O bem da bolsa lhes sai 
E sai caro fazer o bem 
Ela dá ele subtrai 
Fazem como lhes convém 
Ela aos pobres dá uns cobres 
Ele incansável lá vai 
Com o que tira a quem não tem 
Fazendo mais e mais pobres.

Já se deixa ver 
Que não pode ser 
Dar 
Sem ter 
E ter sem tirar.

Todo o que milhões furtou 
Sempre ao bem-fazer foi dado 
Pouco custa a quem roubou 
Dar pouco a quem foi roubado.

Oh engano sempre novo 
De tão estranha caridade 
Feita com dinheiro do povo 
Ao povo desta cidade. 
 


Balthus, 'Still Life', 1937 


"Em Novembro, prova o vinho e planta o cebolinho."

(Provérbio)


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